Nos capítulos anteriores vimos meus princípios pessoais de liderança:
Vimos também o que é cultura empresarial, um conjunto de maneiras de resolver problemas e reagir à situação compartilhado por um grupo de pessoas trabalha junto. E vimos os 5 valores necessários para criar produtos digitais de sucesso:
Acontece que esses valores são necessários, mas não suficientes. Existe um conjunto de quatro valores que são de fato o núcleo de todo time de desenvolvimento de produtos digitais. São os valores que compõem a cultura de produto, que nada mais é do que o conjunto de comportamentos dos times de desenvolvimento de produtos digitais que produzem os melhores resultados. Os quatro valores, que serão tema deste e dos próximos capítulos, são:
Vamos começar com o primeiro: Lançamento antecipado e frequente.
Quanto mais cedo apresentarmos o produto a seus usuários, melhor, pois poderemos receber feedback de usuários reais que poderão usar o produto em seu próprio contexto. Existem 3 razões que justificam essa necessidade de lançar seu produto ou funcionalidade o quanto antes e frequentemente.
Por mais pesquisas, entrevistas e protótipos que você faça, o momento da verdade, ou seja, o momento em que você saberá se o seu produto é, de fato, a solução de um problema de um conjunto de pessoas, é quando ele estiver nas mãos de seus clientes, no contexto onde eles precisam do produto.
Quanto mais tempo você demorar para colocar seu produto na rua, mais tempo demorará para aprender com pessoas reais se você está no caminho certo. E pior, mais passos você certamente estará dando na direção errada.
Você só vai saber se o produto que você fez realmente resolve o problema de algumas pessoas se elas o usarem. Quanto mais tempo demorar para isso acontecer, mais tempo vai levar para saber se ele é ou não é a solução do problema.
E se não for, o que você faz? Conserta, ajusta, muda! Quanto mais cedo você souber que o que você está desenvolvendo não está no caminho certo, melhor, pois menos tempo, energia e dinheiro você desperdiçará indo no caminho errado.
Existe um limite de funcionalidades que o usuário consegue entender. Quando colocamos funcionalidades demais, em vez de criarmos uma solução para o problema do cliente, acabamos criando um novo problema para ele.
Kathy Sierra, reconhecida instrutora de programação e de experiência do usuário, criou um gráfico de funcionalidades que ilustra de forma clara e divertida como a satisfação do usuário diminui à medida que aumentamos a quantidade de funcionalidades de um produto.
Quanto mais tempo seu produto demorar para ter usuários e, consequentemente, clientes que em algum momento pagarão pelo seu produto, mais você terá de investir do seu próprio bolso. Veja a seguir um gráfico típico de retorno de investimento de um produto (ROI).
Enquanto você não o lançar e não tiver receita, tudo o que você terá é custo. Ou seja, você estará na parte de investimento da curva. Isso só muda quando você começar a ter receita e esta for maior do que os custos mensais. Então você entra na área descrita a seguir como rentabilidade mensal. Só depois de alguns meses nessa área é que você terá o retorno do seu investimento. Veja como o caminho é longo.
Agora veja no gráfico adiante, como um atraso de 3 meses em obter receita pode atrasar em 6 meses a obtenção do retorno do investimento. Será que esses 3 meses de atraso em obter receita valem a pena? O que você vai fazer nesses 3 meses realmente compensam 6 meses de atraso no retorno do investimento?
Por outro lado, veja só o que você ganha se conseguir acelerar o desenvolvimento de seu produto e lançá-lo 3 meses antes do planejado. Você ganha 6 meses de retorno do investimento! E a explicação para isso não é só porque você adiantou a entrada de receita, é porque você gastou menos para poder lançar o produto mais rápido. Veja no gráfico a seguir.
Reid Hoffman, fundador do LinkedIn disse certa vez que:
“Se você não tem vergonha da primeira versão do seu produto, você demorou demais para lançar”.
Para ilustrar essa frase, que de certa forma sumariza o valor de lançamento antecipado e frequente, resolvi pegar prints da tela da primeira versão de alguns serviços bem conhecidos.
Minimal Marketable Feature ou MMF vem de um livro de 2003 chamado Software by Numbers, de Mark Denne e Dra. Jane Cleland-Huang. Neste livro, eles introduzem o conceito de:
Metodologia de Financiamento Incremental (Incremental Funding Methodology – IFM), uma abordagem baseada no ROI (Return on Investment – Retorno do Investimento) para o desenvolvimento de software em que o software é desenvolvido e entregue em blocos cuidadosamente priorizados de funcionalidades valorizadas pelo cliente. Esses blocos são conhecidos como Funcionalidades Minimalnimas Comercializáveis ou Minimal Marketable Features – MMFs.
É um conceito anterior ao de MVP, que traz a vantagem dessa mentalidade de implementar o mínimo necessário para cada funcionalidade do produto. A diferença básica entre MVP e MMF é que, enquanto MVP fala de um produto mínimo viável, ou seja, precisa de um produto completo, mesmo que mínimo, para poder ser apresentado a possíveis usuários, o MMF traz esse conceito do mínimo para o nível da funcionalidade.
Para ilustrar o MMF, eles usaram um exemplo muito simples de entender: imagine que você tenha que construir um sistema de internet banking na web. Existem muitos recursos e pode levar muitos meses ou até anos para esse produto ser entregue com todos os recursos “obrigatórios”. Ao pensar em termos de MMF, devemos olhar para aqueles recursos “obrigatórios” e descobrir se podemos lançá-los de forma independente, ou seja, se um determinado recurso, se lançado de forma independente, traria algum valor para o cliente. Em um sistema de internet banking pela Web, poderíamos optar por liberá-lo apenas com extrato da conta e nenhum outro recurso. Esse seria um sistema de internet banking muito simples, mas, se lançado assim que estiver pronto, e não depois que alguns outros recursos também estiverem prontos, ele trará valor para o cliente mais cedo. E sempre que você entrega valor ao cliente, você também entrega valor à sua empresa. Além do cliente satisfeito, neste exemplo você provavelmente reduziu o custo que sua empresa tem em servir esses clientes, pois se os usuários não obtiverem seus extratos de conta pela internet, eles certamente usarão outra forma de obter essas informações e provavelmente esta outra forma não é tão econômica quanto o acesso via internet, como ir a uma agência ou a um caixa eletrônico.
Uma funcionalidade mínima comercializável (MMF) é mínima, porque se fosse menor não seria comercializável. E uma MMF é comercializável pois, quando lançada como parte de um produto, as pessoas usam (ou compram) a funcionalidade.
Da próxima vez que você estiver planejando um novo produto ou conjunto de funcionalidades para um produto existente, tente pensar em termos de MMF. Pode trazer muito valor para você, seus clientes e para sua empresa.
No próximo capítulo veremos a importância de nos focarmos em entender bem o problema a ser resolvido antes de pensarmos em soluções.
Este artigo faz parte do meu mais novo livro, Liderança de produtos digitais: A ciência e a arte da gestão de times de produto, onde falo sobre conceitos, princípios e ferramentas que podem ser úteis para quem é head de produto, para quem quer ser, para quem é liderado por ou para quem tem uma pessoa nesse papel na empresa. Você também pode se interessar pelos meus outros dois livros: