O Prof. Clayton Christensen, professor de Harvard e autor de vários livros – dentre eles The Innovator’s Dilemma: the revolutionary book that will change the way you do business, obrigatório para todas as pessoas que trabalham com tecnologia –, desenvolveu uma técnica para descobrir problemas a serem resolvidos, chamada “o trabalho a ser feito”.
A ideia por trás do “trabalho a ser feito” é que precisamos entender para qual trabalho nossos clientes contrataram nossos produtos, isto é, qual o trabalho que nossos clientes esperam que nossos produtos façam.
Clayton ilustra essa técnica com um exemplo muito interessante. Ele havia sido contratado para avaliar um produto específico de uma lanchonete, o milkshake. A empresa já tinha feito pesquisas com os clientes perguntando o que eles queriam: se eram milkshakes mais densos, com pedaços de biscoito, de fruta ou de chocolate, ou com mais calda. A resposta da pesquisa apontou para uma preferência, que foi implementada. Contudo, essa preferência em nada mudou as vendas, o que era o objetivo principal da empresa.
Clayton decidiu fazer, então, a pesquisa de forma diferente. Em vez de perguntar o que os clientes queriam, procurou entender qual era o trabalho para o qual as pessoas contratavam o milkshake. Após várias conversas com clientes, descobriu que os clientes passavam na lanchonete antes de ir para o trabalho de carro e que ficavam bastante tempo no trânsito. O milkshake, por ser grosso e ser tomado de canudo, demorava para acabar. Demorava o tempo todo da viagem, ou seja, entretinha o cliente durante toda a viagem até chegar ao trabalho. As pessoas contratavam o milkshake de manhã antes de ir para o trabalho de carro para ter com que se entreter no caminho.
Elas já haviam tentado com outros “concorrentes”, como bananas, mas acabava muito rápido. Tentaram também com bagels, mas o trabalho e a sujeira para passar manteiga não compensava. O milkshake era perfeito para esse trabalho a ser feito!
Entendendo o trabalho a ser feito, a lanchonete pôde melhorar o milkshake, deixando-o mais denso e colocando pequenos pedaços de fruta e/ou cereais para adicionar pequenas surpresas enquanto seus clientes os degustavam. Além disso, preparou um sistema de atendimento que minimizou as filas para garantir um tempo mínimo de espera, por entender que seus clientes estavam com pressa e não queriam ficar esperando na lanchonete. Esses ajustes, sim, trouxeram melhorias nas vendas.
O próprio Clayton comenta que, no marketing mais tradicional, é comum associar um determinado produto a um determinado conjunto demográfico. Por exemplo, no caso anterior, se fôssemos responsáveis pela gestão de produtos da lanchonete, poderíamos associar milkshakes com pessoas de certa idade que trabalham e que, consequentemente, sempre procuram milkshake densos que demorem para acabar. Acontece que, usando a técnica do “trabalho a ser feito”, temos uma visão mais ampla do contexto onde o produto está inserido.
Clayton estendeu sua pesquisa para outros períodos do dia e pegou as mesmas pessoas voltando à lanchonete no fim da tarde, só que agora com seus filhos, para um lanche rápido. Com certa frequência, os filhos pediam aos pais por um milkshake. A lanchonete servia o mesmo milkshake: denso, grande, e que demorava para acabar. Só que os pais não queriam esperar muito tempo para que os filhos terminassem seus milkshakes; era para ser um lanche rápido.
Aqui, apesar de o cliente ser o mesmo, o trabalho a ser feito era outro: agradar o filho do cliente de forma rápida. Sendo assim, o milkshake poderia ser menor, talvez metade do tamanho, e menos denso, para acabar mais rápido.
O mesmo cliente quer que o mesmo produto faça trabalhos diferentes, a depender da situação. Daí a importância de entender o trabalho a ser feito.
Neste capítulo e no anterior, aprendemos como entender mais sobre um problema de um grupo de pessoas; entender a fundo seus problemas e o contexto em que eles acontecem; e entender a motivação que as pessoas têm para querer que ele seja resolvido.
Eventualmente, ao usarmos a técnica do trabalho a ser feito, fica a dúvida: será que temos uma boa oportunidade em mãos? Ou ainda, pode acontecer de encontrarmos mais de um problema. Como escolher, dentre esses problemas, qual é a melhor oportunidade a ser explorada? É o tema do próximo capítulo.
Este artigo é o 12º capítulo do meu livro Gestão de produtos: Como aumentar as chances de sucesso do seu software, onde falo sobre o que é gestão de produtos digitais, seu ciclo de vida, que ferramentas utilizar para aumentar suas chances de sucesso. Você também pode se interessar pelos meus outros dois livros: