Delegar é o ato de confiar uma tarefa e/ou uma responsabilidade a alguém, normalmente com menos senioridade do que a pessoa que está executando o ato de delegar. A liderança é um ato contínuo de delegação de tarefas e de responsabilidades. Parece um ato bastante simples mas tem vários aspectos importantes a serem considerados para aumentar as chances de sucesso.
Jurgen Appelo, autor do já mencionado livro Management 3.0: Leading Agile Developers, Developing Agile Leaders, comenta que delegar não é uma decisão binária em que você delega ou não delega. Existem outros níveis de delegação entre esses dois extremos e cada um desses outros níveis deve ser usado dependendo do contexto, ou seja, do problema a ser resolvido e de quem vai trabalhar nele. Segundo ele, são sete níveis:
Confesso que no meu dia a dia não penso sobre que tipo de delegação estou fazendo em cada situação, é algo mais intuitivo do que pensado, mas é bom conhecer e relembrar essas diferentes formas de delegação. Tenho a impressão que entre “dizer” e “delegar” há mais do que 5 opções. Navegamos entre essas opções de forma fluida de acordo com a senioridade do time, a experiência específica do time com o assunto em questão e o quanto o tema em questão implica em riscos.
O conceito de delegação anda de mãos dadas com o conceito de microgestão:
Microgestão
Microgestão é o estilo de gestão em que o gerente observa ou controla de perto o trabalho de seus subordinados ou funcionários. A microgestão geralmente possui uma conotação negativa.
Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Microger%C3%AAncia
A microgestão mostra a incapacidade de delegação do líder. Normalmente há duas razões para um líder microgerenciar seu time:
O mais comum é encontrar líderes com insegurança, normalmente pessoas que estão liderando pela primeira vez, mas que eventualmente acabam entendendo seu papel e exercendo a delegação. Já líderes que microgerenciam devido à sua personalidade são mais raros e dificilmente vão mudar.
Pessoas que estão em um time que está sendo microgerenciado tendem a rapidamente se desengajar. Uma vez que estão fazendo as coisas do jeito do gestor, não se sentem responsáveis pelo resultado obtido, seja o resultado bom ou ruim. Se o resultado for bom, o líder provavelmente vai atribuir o sucesso ao seu jeito de fazer as coisas. Se der errado, a pessoa que fez o trabalho não se sentirá responsável, pois “apenas seguiu ordens”.
Uma das maiores barreiras para a delegação é a certeza que o líder tem de que seu jeito de fazer as coisas é o correto. Quando ele era um contribuidor individual ele fazia as coisas desse jeito e o resultado vinha. Tanto é que ele foi promovido a gestor por fazer as coisas daquele jeito. Então, o que ele entende que tem que fazer como gestor é garantir que todas as pessoas do seu time façam as coisas do jeito que ele faz. Nesse momento a necessidade de microgestão desse líder aparece.
Um líder deve sempre se focar no resultado esperado. A forma como esse resultado é atingido é menos importante do que obter o resultado. Se uma pessoa de sua equipe faz as coisas de forma diferente do que você costuma fazer, isso não significa que a forma como ela faz está errada (claro, desde que não seja uma forma ilícita e não prejudique as pessoas). É só uma forma diferente de fazer as coisas. Talvez até uma forma mais eficiente. O líder precisa respeitar essa diversidade de maneiras de se fazer as coisas e apenas apresentar a sua forma de fazer quando notar que a pessoa não está conseguindo evoluir sozinha.
Toda vez que delegamos algo para alguém fazer, caso seja a primeira vez que aquela pessoa está fazendo, será uma oportunidade de aprendizado. Por esse motivo, é muito provável que a pessoa cometa alguns erros e aqui entra um dos trade-offs mais difíceis de um líder. Quanto de erro é aceitável? Isso depende muito de cada situação, cabe ao líder entender se os erros são aceitáveis para permitir o aprendizado, ou se dada a criticidade do trabalho a ser feito, erros devem ser minimizados. Devemos sempre criar um ambiente propício ao aprendizado a partir dos erros, pois esse será o aprendizado mais eficaz. É o que busco fazer com os times que lidero.
Pronto, com este capítulo concluímos a parte sobre meus princípios pessoais de liderança (pessoas: a prioridade nº 1, sempre; liderar é como ser um médico; liderando sob pressão; mentoria é uma via de mão dupla; e como e quando delegar). Nos próximos capítulos, veremos o que é cultura e quais são os valores que acredito serem obrigatórios para criar produtos digitais de sucesso.
Este artigo faz parte do meu mais novo livro, Liderança de produtos digitais: A ciência e a arte da gestão de times de produto, onde falo sobre conceitos, princípios e ferramentas que podem ser úteis para quem é head de produto, para quem quer ser, para quem é liderado por ou para quem tem uma pessoa nesse papel na empresa. Você também pode se interessar pelos meus outros dois livros: